sexta-feira, 12 de junho de 2009

Reivindicação do Ultramar Português ( 2 )

ULTRAMAR ANTES E DEPOIS DA TRAIÇÃO

NOTA:
Composto o texto que acima se lê, eu esperava a todo o instante um documento muito apetecido que o Walter Ventura --- meu querido amigo e velho camarada de armas, herói de guerra dos de primeira plana --- me anunciara.
Dificuldades informáticas, entretanto surgidas, impediram-no de me enviar logo o prometido. Por isso e à cautela, enquanto aguardava, decidi ir publicando o que era da minha autoria.
Há pouco, foi o obstáculo removido. E como as palavras chegadas têm assinatura do Rodrigo Emílio, são irrecusáveis.
São precedidas de uma expressiva introdução de quem as enviou.
JMC
Em nome (já não do MAP), mas dos combatentes Amanhã, voltarei ao Restelo onde se realiza já não sei bem que cerimónia ligada aos Combatentes do Ultramar. Uns dizem que de homenagem aos que uma vez se "vestiram de soldados", como diria Rodrigo Emílio. Eu não iria lá por isso. Entendo nada me ser devido por ter tido a honra de cumprir um dever que então se impunha. Iria lá, talvez, homenagear os - os meus e todos os outros - que tombaram ao serviço da Pátria; os soldados "ao solo dados" (outra vez o Rodrigo!). Mas tais têm sido as tropelias que se têm vindo a acumular frente ao monumento dos Combatentes, ali mesmo à ilhaga daquela Torre que evoca tempos de glória mas também de honra que já nem isso me resta. Assim, muito simplesmente, vou lá na certeza de encontrar um punhado de camaradas de campanha que me praz rever, ao menos de ano a ano. Da cerimónia em si mesma, não sei nem quero saber. Não sou só eu, diga-se em abono da verdade e já vi gente revoltada virar as costas à tribuna onde o orador contratado vociferafa palavras que nos revoltavam. Foi o que aconteceu no ano passado com o discurso do prof. César das Neves. Já houve pior: até desertores por lá passaram... em anos que preferi ficar em casa. Este ano, dizem-me, o convidado de honra é o prof. Manuel António Garcia Braga da Cruz. Deve ser cruz minha mas o nome mexeu-me com as meninges e sacudiu-me o fígado. E, valha a verdade, é um nome ilustre... por parte do pai do orador e demais antepassados. Tanto que, nos idos de 70, raiava a florida "revolução" pelas ruas deste rectângulo que nos resta, o escolhemos para encabeçar um movimento que queríamos a negação da arruaça que por aí andava de cambulhada com uma traição como jamais varrera terra lusitana. O Prof. Braga da Cruz aceitou. O que depois se passou, melhor do que eu faria, aqui fica contado pelo Rodrigo Emílio (que muitos, hoje, gostam de citar mas poucos parecem ter o ânimo para lhe seguir as pasadas), num exerto de um texto seu, intitulado "Em nome do MAP", demasiado longo para caber neste blogue. Mas o que se segue é suficientemente esclarecedor. Resta-me agradecer ao meu velho amigo e camarada Joaquim Maria Cymbron a lanheza com que me disponibilizou esta sua casa - a mim pobre "desblogado" - para este desabafo que, bem sei, pouco incomodará gente acomodada. Mas leiam e que vos preste. Aos meus velhos amigos de velhas campanhas, como diria o outro: "Até amanhã, camaradas"!
Walter Ventura
NARRATIVA COMPLETA DA CABALA CONTRA O M. A. P.
(As linhas com que a mesma se coseu, num relato, pessoalíssimo, de Rodrigo Emílio)
Escrevo de um país livre. Quer isto dizer que estou finalmente em condições de reconduzir à luz da verdade um sem-número de afirmações caluniosas, postas a circular nos mais infectos órgãos dessa infecta Imprensa. Semelhante acervo de aleivosias reclama da minha parte a mais vigorosa contestação, porquanto envolve directamente o meu nome, brigando desde logo com a honradez do mesmo, e atenta, muito principalmente, contra os nomes (igualmente honrados, e sobremaneira honrosos) de alguns excelentes companheiros de ideário, que, a estas horas, se encontram discricionariamente encarcerados em Caxias, às ordens dos bandoleiros de Otelo/Cunhal/Gonçalves/Inácio & Cª.O depoimento que eu aqui passo a alinhar por escrito, bem poderia administrá-lo de viva voz, se porventura me tivesse deixado apresar pelos bandos de malfeitores armados que já mencionei. Não quis o acaso que eu, e mais uns tantos, fossemos elevados à (in)dignidade de prisioneiros dessa hedionda canalha de facínoras, que por aí age, a seu bel-prazer, e livremente se move, a coberto de um (des)governo de altíssima — traição, — quando não com o seu beneplácito, quando não com a sua cumplicidade, quando não com a sua instigação. E, se por um lado é certo que, em matéria de aprisionamento, penso, pessoalmente, o mesmo que pensava Afonso Lopes Vieira, quando lapidarmente observou, um belo dia, que“O poeta português, que não passar ao menos uma vez pelas prisões, não é digno aluno de Camões”,por outro lado, não é menos verdade que nunca gostei de ser tocado por mãos sujas, — só deplorando que tenham caído em poder delas muitos meus melhores camaradas. De toda a maneira, sei que estou exemplarmente representado por eles nas celas do segredo, para poder representá-los condignamente na liberdade do exílio. E só por tal motivo é que aceito passar pelo vexame — aliás, bastante improvável — de comparecer, aqui e agora, com este articulado, nas abjectas colunas do periodismo jornalístico d`antre Minho e Guadiana. Há quem diga que da calúnia sempre alguma coisa fica. Eu pretendo que da calúnia coisa alguma subsista, — pelo menos, desta feita. Concretamente. Vêm ao caso historiar a génese (e, sobretudo, precisar as finalidades) do chamado Movimento de Acção Portuguesa — M. A. P. —, que tão miseravelmente difamado veio a ser, em bases de clamorosa falta de verdade, e mediante a mais gratuita, a mais falsa e falsificadora campanha de pasquinadas que conceber se pode. Na sequência (e a pretexto) dos grotescos acontecimentos de 28 de Setembro de 1974 — com os quais o M. A. P. ainda em fase de estruturação, nada teve que ver —, logo uma diluviana bátega de atoardas, tudo o que há de mais inconsistente (como ao depois veio a verificar-se), desabou em peso sobre o Movimento. Animados pelos desígnios mais tortuosos, os mentores do bairro-da-lata do nosso jornalismo bem-pensante, sem mais perdas de tempo do mesmo assestam baterias sobre o M. A. P.; e vá de exporem os responsáveis, e restantes elementos do mesmo, à execração pública, imputando-lhes propósitos positivamente tenebrosos: e nada mais nada menos do que um duplo (ou um triplo) assassinato. A saber: a eliminação física de Spínola, a par da de um tal Gonçalves (segundos uns); a deste, e a de um Antunes (a crer na versão de outros); ou o extermínio, pura e simplesmente, de todos os três, logo ali, de uma assentada (conjectura formulada pelos mais ambiciosos analistas do caso). Em suma: um fartum de sangue… e três “deles p`ró galheiro!...”No detectivesco entender dos plumitivos, só uma coisa não dava lugar a quaisquer dúvidas: tamanha hediondez seria consumada a partir duma larga janela envidraçada, a qual janela apresentava (nem de propósito!) um fotogénico orifício, com vista para Gonçalve`s home, já se vê. O resto da operação facilmente se adivinha: pela brecha espreitaria uma espingarda (de mira telescópica e tudo, igualzinha à tal que, em Dallas, vitimou o Presidente Kennedy), e zás-pás, que por aqui me avio: pontaria certeira a dar em cheio no alvo; um homenzarrinho a entornar-se e a malhar redondo no meio do chão, abatido à queima-roupa por dois ou três tirázios… — e adeus, Gonçalves, que te foste à viola!Como se vê, tudo muito bem concertadinho! Tudo a bater certo… até aqui. Mas só até aqui. Porque, às duas por três, os dados da história alteram-se por completo, as coisas transformam-se de todo em todo, e a versão (tão meticulosamente urdida) deixa de ter ponta por onde se lhe pegue. Foi o caso que a janela incriminada, afinal de contas não pertencia tal às instalações do M. A. P.: pertencia, sim, ao inquilino do andar de cima — João Manuel Sousa (ou Cardoso?!)/Atelier, rezava a tabuleta que ele tinha aposta à ilharga da porta —, em casa do qual (logo por azar…) funcionava uma célula do Partido Comunista. De resto, foi o próprio locatário da mansão a que pertencia a janela difamada — ele mesmo, em pessoa — quem, primeiro que ninguém, pôs as coisas quase a claro, em entrevista concedida ao diário da tarde “A Capital”. Nas declarações que em boa hora prestou — et pour cause… — ao vespertino lisboeta, o proprietário da injuriadíssima janela (arquitecto de sua profissão, consoante ficámos a saber) deu por paus e por pedras que a sua vidraça estivesse implicada em qualquer atentado, alegando que não senhor, que se tratava de um equívoco fotográfico, que lá a sua janela desfrutou sempre de uma reputação inatacável, e que tudo o que ele mais encarecidamente implorava, era que lhe deixassem a pobre janela, a sua bem-amada janela, em paz e sossego. Mais adiantou — com geral surpresa dos setembristas mais cavilosos — que o intrigante buraco ostentado pela vidraça era coisa antiga, imemorial, muitíssimo mais idosa do que o M. A. P.. O que se chama um estilhaço já com barbas, um estilhaço de longa data… Acentuou, mais ainda, que o acesso à janela apedrejada estava humanamente vedado às hostes do M. A. P., a menos que estas se soerguessem do primeiro ao segundo piso e lhe entrassem marcialmente pela porta dentro, e assim, profanassem a intimidade da sua própria casa, — o que não era de todo em todo crível, a seu ver.De onde se segue que a eventualidade de alvejar Gonçalves dos aposentos políticos do M. A. P. era proeza, quanto a ele, impraticável, fosse de que ponto ou ângulo fosse, já que as instalações do Movimento não deitavam, de banda nenhuma, para os domínios residenciais do sobredito Gonçalves. Para atingir este, a tiro, não havia, realmente, como a casa do entrevistado, — que essa, sim: dava em cheio para (o Teatro Municipal de) de São Bento, e precisamente através da tal janela…, do alto da qual o sr. Gonçalves era, em verdade, figo no papo, à boca de toda e qualquer arma que o visasse com afinada pontaria, e se lhe desfechasse sobre a preclaríssima testa.Claro que não foi por muito nobres razões, nem foi tão-pouco pelos lindos olhos dos militantes do M. A. P. (todos eles, de resto, uns mal-encarados — na douta opinião do interlocutor d`”A Capital”), que o interpelado publicamente se apressou a render meio-tributo à verdade.O caso foi bem outro. Muito simplesmente, aconteceu que o arquitecto-vermelho-nosso-vizinho veio a ver-se praticamente compelido a falar quase-verdade, do ponto em que toda a cabala desencadeada contra o M. A. P. gravitava em torno de um equívoco, altamente comprometedor para o nosso homem: com efeito, o cavalo de batalha de toda a acção incriminatória, fomentada, à outrance, pelas grandes centrais da (des)informação, dizia respeito, preponderantemente, à estratégica janela, — cuja imagem, copiosamente difundida e propagada nos jornais, era tida e havida por estes à conta da dependência do M. A. P.. Porém, muito se engana quem mal cuida… A vidraça, ao cabo e ao resto, tinha tanto que ver com a sede do M. A. P. como o Movimento das Forças armadas… em forças com Forças Armadas autênticas!... Pertencia, sim, ao arquitecto: era irrefutavelmente sua, a janelinha… E contra isso, não havia a fazer nada, a não ser aquilo mesmo que ele fez: na impossibilidade de se libertar, como por encanto, da sua qualidade de dono e senhor da embaraçosa vidracinha, ei-lo que trata de atalhar, sem mais demora, ao curso da lenda negra do grande e horrível crime, — antes que semelhante balela viesse a assumir maiores proporções e incremento do que as já tinha tomado, e o envolvesse, assim, a ele, de forma irreparável, na tremebunda teia. Mas, não querendo ficar amarrado, unicamente, ao antipático e impopularíssimo papel de contraditor de inventonas que tanto jeitinho faziam ao Partido, daí o arquitecto e, num lampejo resgatador, arquitecta, logo ali, uma versão de alternativa, — quanto a ele, muito mais plausível: bem vistas as coisas, o décor do crime seria o telhado do próprio prédio. Só que esta hipótese de recurso, adiantada o que se chama em desespero de causa, está longe de ter, também ela, o condão de ilibar de implicações aquele que a formulou uma vez que os do M. A. P., para se alcandorarem à cobertura do prédio, teriam fatalmente de passar, ao que parece, por causa do Sousa (Cardoso, ou lá o que é…), e só daí poderiam içar-se à flor das telhas… Moral da história: pior que o soneto, terá sido a emenda!E assim ruiu por terra a engenhosa e formidanda maquinação tramada contra o M. A. P. pela Imprensa em peso. (Neste capítulo, cabe acentuar que, quando a entrevista em apreço veio a lume, já a campanha orquestrada, contra o Movimento, pelos principais órgãos de (des)informação, tinha atingido o paroxismo da distorsão e o auge do tremendismo sensacionalista. Como não podia deixar de ser, foi no “Expresso” que tudo começou a ganhar corpo: o presumido semanário do milionário Menelau Francisquinho Balsemão — com a petulante leviandade, a ligeireza de processos e aquele poder de especulação barata que lhe vêm sendo proverbiais — deu o mote para o motim, ao declarar a público, na página de rosto do número referente aos primeiros rescaldos do 28 de Setembro, uma empolgante sequência fotográfica, que se pretendia elaborada (a crer no teor da legenda respectiva) por não sei quantos peritos em balística. A ilação a tirar desse fio de imagens, alinhadas na contiguidade umas das outras, era só esta: Gonçalves, o soez, baquearia, com milimétrica precisão, exactamente entre o terceiro e quatro degraus da escadaria que conduz à sua casa oficial —, baleado, por um atirador especializado do Movimento de Acção Portuguesa, a partir da fenda da janela que se supunha ser do M. A. P… mas não era).Estes, os tópicos da calúnia, provincianamente brandidos — e pré-fabricados — pelo perversíssimo “Expresso”, e ao depois glosados até à exaustão, nas colunas confradescas da chamada grande Imprensa do rectângulo (designadamente: diários “ de Notícias”, “de Lisboa” e “Popular”, “Comércio do Porto” e “Sempre-Fixe”). No fundo, foi só uma questão de pegar na deixa, largada em primeira instância pelo “Expresso”, e vá de ver, então, o garotio jornalístico de Lisboa e Porto, a destilar infâmias e verrina, às catadupas, sobre o M. A. P., e mormente sobre os nomes visíveis do Movimento. Os impropérios choveram, um pouco de toda a parte, — assistindo-se a espectáculo sobremodo indecoroso.Durou cerca de oito dias a fio esse afã denegridor, desenvolvido à escala (des)informativa da Metrópole, através de inflamadas catilinárias, todas elas enfeitadas — a título pretensamente ilustrativo ou documental — com a imagem da invariável e vedetíssima janelinha, — que se alvitrou ser do M. A. P…. mas não era. (— Seguramente, nunca uma vidraça vulgar de Lineu “posou”, tão para profusamente, para os jornais!...) E o que é facto é que a empreendedora campanha só veio a abrandar, depois d`o Sousa “grenat” ter dito à “Capital aquilo que disse. Aliás, o teor — sumamente contrariante, e por demais concludente — da palinódia que produziu, acabou por dar lugar a pitorescos e muito discretos desmentidos, balbuciados o mais à contre-coeur que se pode imaginar… E assim, ocorreu que muitos dos periódicos estremenhos, que — impunemente, e a seu bel-talante — haviam de forjar tão delirante fábula, se viram, desde logo, na contingência (desagradabilíssima, valha a verdade) de dar o dito por não dito. Ainda assim, e a título de ressalva, tiveram o cuidado de decalcar, como bastante provável e perfeitamente exequível, a redentora conjectura do Sousa, segundo a qual: do telhado é que era… Quer dizer: pegara-lhe no alvitre e, sem mais aquelas, propalaram como certa a hipótese congeminada e aventada por ele. Não estiveram lá com meias medidas; e dando fé de um espírito de isenção muitíssimo bem doseado, trataram de insinuar — de forma extremamente canhestra, diga-se em abono da verdade… — que não era afinal de contas, da janela escaqueirada, e sim lá do alto do prédio, que os do M. A. P. se propunham ajustar contas em atraso com o famigerado Gonçalves, colocando-o no ponto de mira de uma carabina com alça telescópica, «modelo Dallas»…Quanto a esta, tão-pouco havia vestígios dela, em toda a sede do M. A. P.. De onde se segue que, tanto (des)governantes como periodistas, COPCÃOS como PC, milicianos da Marinha e/ou assassinos da LUAR — que é tudo, de resto, a mesma tropa fandanga…— andam, certamente, a sonhar com armas (e com armas de primeira grandeza, ou seja: quanto mais mortíferas, melhor!) — Eles lá sabem porquê… Nós também. Claro está que nem todos os chamados órgãos escritos(?) de comunicação(?) social se deram ao trabalhinho, ou tiveram a elementaríssima hombridade, de emendar a mão, — quanto mais não fosse, ao menos por especial deferência para com as declarações (algo clarificadoras) do camarada arquitecto… Foi o caso, por exemplo, d`um covil chamado “Diário de Lisboa”, que depois de se ter referido, com toda a voltagem do ódio, a “Um covil chamado M.A.P.” erguendo contra o Movimento o mais ignóbil arrazoado de insinuações e de injúrias de que tenho notícia, não se conformou com o facto de as ver cair da tripeça: e, longe de consentir que o chorrilho de mentiras debitado nas suas colunas cedesse o passo às meias-verdades que o Sousa (Cardoso, ou lá o que é…), entretanto, confiara à “Capital”, — vai daí e limita-se a quebrar o silêncio, um tanto comprometidido, a que prudentemente se remetera, com a publicação de uma carta (entre)aberta, por demais expressiva. Passemos, pois à cartinha, e vejamos qual a cartada que com ela pretendeu jogar a matulagem de delactores da Luz Soriano.Aparentemente, o signatário da missiva — de sua graça, Manuel António Garcia Braga da Cruz — sai a campo, e vem a terreiro, movido pelos mais nobres sentimentos filiais, quais sejam os de terçar armas em prol do bom nome do senhor seu pai, professor doutor Guilherme Braga da Cruz. No entender do impoluto rebento, a honorabilidade de Braga da Cruz (pai) estaria a ser abusivamente maculada por quantos se arrogaram o desplante de assacar, ao reputado catedrático de Coimbra, a dignidade de Presidente de Honra do negregado Movimento de Acção Portuguesa, atribuição essa que muito vivamente se contesta, agressivamente se refuta e categoricamente se desmente e repudia, no teor do documento epistolar a que temos o prazer de reportar-nos. — “Que amor de filho, este Manuel António!”, — hão-de ter comentado, seguramente, os mais incautos leitores da carta. Mas estavam eles muitíssimo enganados, se de tal sorte exclamaram: redondamente equivocados, quanto à pureza de intenções do carteante!... Porque, no fundo, o que o terá determinado a expender as considerações epistolares que revelou a público, não foi tanto o imperativo, a todos os títulos exemplar, de limpar o nome paterno de nódoas que este não tem, como de se limpar, a si próprio, do nome que herdou, e que ele transporta, penosamente, como quem arrasta um sudário… O impopular ferrete político que há várias gerações impende sobre esse ramo da família Braga da Cruz — clã tradicionalmente monárquico e nacionalista, como se sabe —, já de si dificulta e afecta, em muito, a posição dissidente que o jovem Manuel António à viva força pretende implantar no campo da batalha das ideias peculiares aos seus maiores.Logo, temos que: tudo o que concerne, publicamente, aos Braga da Cruz — e com maior força de razão, ao pai Guilherme — automaticamente se reflecte na vida política do moço, atingindo-o por tabela, como lindamente se compreende, — e, traumatizando, assim, toda a projecção que ele certamente visará fruir, como lidador de um ideário inteiramente contraposto ao da sua parentela mais chegada. Ora, ao ver o nome do pai intimamente associado aos da gente do M. A. P., e directamente envolvido, desde logo, na diabólicazinha tramóia que os vermelhos dos jornais (bandeados com as fardas terroristas do COPCÃO e com os bandos de bandidos da LUAR) armaram às hostes do Movimento, sob a bênção todo-poderosa do sicários comunistas enaipados no Governo, —eis que o nosso Manuel António rapa desabusadamente da caneta, e, por sua conta e risco, trata de salvaguardar-se, sem mais delongas, do opróbrio de se chamar Braga da Cruz. Para tanto, simula defender o pai, sem que este — ao que me consta —lhe tenha encomendado o sermão, ou passado procuração para tal. Até porque não é, propriamente, em defesa do pai (digo e repito), que Manuel António sai à estocada: defende-se, sim, a si mesmo, por bem perceber que tudo o que politicamente idealizou e sonhou para si, periga, muito seriamente, por via da incómoda filiação que o vincula, e a que está amarrado pelas leis implacáveis do sangue. Não protege o nome do pai: protege-se do nome do pai, acautelando, assim, a incidência nociva que os apelidos patronímicos podem vir a ter sobre ele, e sobre a carreira política que para si terá talhado. E daí que ele que se ponha a negar o inegável.Passando a explicar-me melhor, o caso é este: Braga da Cruz júnior, longe de trilhar — ideologicamente falando — as mesmas passadas paternas, milita, muito pelo contrário, nas fileiras do M. E. S. (Movimento de Esquerda Socialista), — e creio que está (quase) tudo dito, quanto aos inconvenientes, sem dúvida gravíssimos, de ostentar um nome que é um estigma cem-por-cento reaccionário. Demais a mais, a partir do momento em que Braga da Cruz (pai) foi tido e havido, à boca pequena, como Presidente de Honra de “um covil chamado M.A.P.”, que tramava “coisas do arco-da-velha”… Ora, a verdade é toda outra: se, por um lado, carece do mais elementar fundamento — como termos o ensejo de salientar adiante — que o Movimento de Acção Portuguesa fosse visto e achado em maquinações de morte-de-homem, por outro lado, não deixa de ser exacto que o Prof. Dr. Guilherme Braga da Cruz presidia, de facto, de direito, e a título honorífico, ao nosso Movimento. Ou seja: lá que era ele o Presidente de Honra do M. A. P., lá isso era, por muito que tal confranja o filho. De resto, posso atestar, pessoalmente, os termos inequívocos, e nobilíssimos, diga-se — com que Braga da Cruz deu o seu aval ao M. A. P.. Com efeito, estive presente, em carne e osso, à sessão de abordagem que nesse sentido lhe foi feita. E, já que o Manuel António — bem secundado, de resto, pelo indesculpável silêncio a que seu pai lhe votou a carta — quer obrigar-me a falar, — nesse caso relatarei como tudo se passou, tim-tim-por-tim-tim. A sorte daqueles de nós que a estas horas penam nos calabouços, repletos, da “democracia vermelha” instaurada a 25 de Abril, não se compadece com retraimentos mais ou menos encobridores, nem tão-pouco com omissões acobardadas, venham elas de quem vierem.Foi na sua casa de Coimbra que o prof. Dr. Guilherme Braga da Cruz nos recebeu, pela primeira vez. Batemos-lhe ao ferrolho numa noite de fins de Junho, e logo de entrada lhe dissemos ao que vínhamos: concitá-lo a aderir ao M. A. P.. Que o M. A. P., fundamentalmente, era um núcleo de inteligências e vontades, indefectivelmente aferradas a um código de honra puramente nacional. Mais lhe fizemos saber que os quadros de recrutamento do M. A. P. se baseavam em gente norteada, única e exclusivamente, por um alto sentido de fidelidade a valores e princípios de sempre, e por toda uma força de convicções, que o desastre — militar, histórico, político, social e económico — do 25 de Abril), não tivera o condão de abalar, no que quer que fosse. Que não nos empolgavam veleidades eleitoralistas, nem tão-pouco nos seduziam as manobras tacticistas, a que muitas direitas — subitamente envergonhadas de o serem — desde logo se entregaram, alardeando uma esperteza bastante saloia, valha a verdade, e sem que daí lhes adviesse, ao cabo e ao resto, qualquer parcela de honra, ou proveito de maior, como ao depois veio a ver-se… Reforçando, mais ainda, a posição, inequivocamente frontal, que o M. A. P. se propunha cravar a prumo, e implantar como sua, no concerto de indignidades e oportunismos a que um pouco por toda a parte se assistia, — inteirámos o Prof. Braga da Cruz de que a nossa intransigência não conheceria tréguas nem limites, e que surgiríamos inteiramente a descoberto, dispostos a agir, e a reagir, por pensamentos, palavras e obras à prova de quaisquer subterfúgios calculistas. Que não lisonjearíamos, fosse como fosse, quem quer (ou o que quer) que estivesse ligado, de algum modo, à pirosa revolução dos cravos vermelhos (já então, conhecida, também, por Revolução do Mau-Hálito). E que às vénias rasgadas, que muito boa gente ia fazendo à Junta de Perdição Nacional — e a idênticos comandos d`alta traição —, responderia o M. A. P. com os veementes exorcismos e manguitos que a circunstância impunha. Também logo ali demos conhecimento, ao nosso futuro Presidente de Honra, do propósito de nos colocarmos, de antemão, fora de toda a “farsa democrática”, por variadíssimas razões pormos e, mormente, por acharmos de mau-gosto — pelo menos, de muito mau gosto — a perspectiva de nos pormos, também nós, a jogar xadrez, ao tempo em que Damasco ardia. Integristas em matéria de fé, integralistas em ordem à doutrina, integracionistas quanto a Ultramar, — como tal nós nos perfilávamos no grotesco décor político que a todos se oferecia presenciar. Tocados pela mola-real do arrivismo, outros, que não nós, se deixariam atrair pela corrida às pastas ministeriais, e mais coisitas assim… Nós, os do M. A. P., singularizar-nos-íamos no domínio, apenas, das motivações cem-por-cento nacionais, posto que só o destino histórico da Nação Portuguesa, e absolutamente mais nadinha, nos sensibilizava a valer. De comum acordo, decidimos que havia que proceder, para tanto, a um levantamento de nomes de personalidades, o mais puro possível, e que constituí-los, depois, em Comissão de Honra que pontificasse nas mais altas esferas hierárquicas do M.A.P., e que exemplarmente presidisse, assim, aos supremos destinos do Movimento. Porque, também neste particular, nós fizemos questão de agir muitíssimo ao invés dos outros, que, lançados, também eles, à cata de bênçãos avalizadoras, sempre se ativeram, e se circunscreveram, para o efeito, a um acanhado lote de homens públicos, - sempre os mesmos de sempre, e de todos eles de reputação por demais esclerosada. Quer dizer: o que mais havia, era quem gravitasse no círculo vicioso, e extremamente estreito, de uma classe política viciada. Mas nanja o M.A.P.; e por isso mesmo é que ali estávamos: ali, e não alhures. E que tudo o que o M.A.P., em síntese, se propunha, era deixar lavrado um vigoroso protesto nas actas, digamos, da alta-traição, que com todo o descaro se consumava, dentro do maior desaforo e na mais clamorosa impunidade. E era desse protesto que nós nos fazíamos portadores. Ali lho levávamos, pois, por escrito, e sob a forma de decálogo programático do Movimento, para que o sr. prof. Braga da Cruz fizesse o favor de o passar a ler, e dissesse, depois, de sua justiça.Ainda manuscrito de fresco, o papel tombou sob os olhos do catedrático, e em suas mãos se deteve, por largos e atentos minutos de leitura e ponderação, após o que o nosso anfitrião se pronunciou, declarando que sim, senhores: que dava o seu pleno assentimento a todos os pontos do nosso programa. Inclusivamente, revelou que já dois agrupamentos políticos, antes de nós, ali tinham feito deslocar os respectivos representantes, também à conquista de uma adesão, - no que foram, de resto, mal sucedidos (esclareceu o Professor), uma vez que qualquer dos grupos solicitantes não reunia, a seu ver, as duas condições necessárias e suficientes para obterem dele o almejado beneplácito. A saber: uns e outros já, entretanto, tinham cometido a ignomínia, quanto a ele e quanto a nós inqualificável, de tirar “aos da Junta” a deferente chapelada da praxe (“atitude que me contende com os nervos” – comentou o velho Professor – “e que desde logo arreda, da minha parte, toda e qualquer hipótese de apadrinhamento ou de avalização partidária); acresce, por outro lado” – precisou, de caminho, Braga da Cruz – “, que mesmo em termos de ideário de combate, ambos os grupos me deixavam muito a desejar”. E daí que os não tivesse afiançado.Connosco, porém, já outro galo cantava, dado que não só não tínhamos incorrido na abjecção de render preito de vassalagem aos mais altos quadros – por assim dizer, à cúpula mesmo – da traição (…e jamais o fizemos ou faríamos por não estar isso na massa do sangue…), como o que é facto é que o teor da nossa linha de pensamento em acção afinava, a cem-por-cento – no dizer do conceituado professor -, pelo diapasão da sua óptica ideológica.E tão corajosos, e tão inequívocos, foram os termos com que Braga da Cruz logo ali autenticou a sua inteira vinculação ao M.A.P., que um dos presentes não se teve que não tratasse, espontaneamente, de o convidar a aceitar a Presidência de Honra do Movimento. E o caso é que, entre rogado e visivelmente comovido, o Professor lá anuiu de pronto ao convite que lhe fora formulado, dispondo-se a assumir a mais alta presidência do nosso Movimento, “mas a título predominantemente honorífico” – observou ele -, dado que se encontrava assoberbado de trabalho e entregue a inadiáveis tarefas de investigação e de erudição universitária, sendo assim de aduzir que lhe escasseava tempo disponível para poder desenvolver, no âmbito do M.A.P., qualquer actividade partidária propriamente dita, qualquer acção ou actuação partidárias dignas desse nome. Admitiu, quando muito, a viabilidade de comparecer, em carne e osso, num ou noutro comício, numa ou noutra sessão pública, que porventura levássemos a efeito. Em contrapartida, não deixou de sublinhar – e bem frisantemente – que o nome dele ficava, daí em diante, à nossa mercê, e que fizéssemos do seu nome, se tal nos fosse de alguma utilidade, o uso que muito bem entendêssemos.De onde se segue que não houve, assim, da nossa parte, a mínima “tentativa de instrumentalização (…) do nome” de Braga da Cruz (pai), como quer fazer Braga da Cruz (filho), na carta miseravelmente falseadora que o Diário de Lisboa tornou pública. Foi ao abrigo da autorização que, para esse efeito, nos deu o próprio catedrático, que nós, por mais de uma vez, invocámos o seu nome. Mas em circunstância nenhuma o invocámos em vão: disso pode estar ciente o prof. Braga da Cruz. E eu sei que está.Até porque não faltou quem – ingloriamente, aliás – desde logo tentasse demover o velho Mestre de Coimbra do apalavramento que nos dera, e que ele viria a reiterar, em diversas ocasiões, sempre de forma incontroversa e de molde a não deixar margem a quaisquer dúvidas.Entre os emissários, os enviados especiais (não sei de quem), que não sei quem destacou para terras do Mondego, e que em casa de Braga da Cruz mui pressurosamente se apresentaram, a impingir-lhe outra mercadoria político-partidária, que não o M.A.P. (tido e havido – por esses, e por outros que tais – à conta de pouco recomendável e de muito mal-afamado…), - avultam dois videirinhos de alta-escola, e acaso, os mais conceituados de todos os ineptos. Seus nomes. Mário Júlio de Almeida Costa e José Augusto Rebelo da Conceição.Mas não tiveram sombra de sucesso, junto do nosso Presidente de Honra, essas – e outras – manobras de dissuasão, manipuladas do escuro… sabe-se lá porquê e por quem!... Pessoalmente, sei, de ciência certa, que o Professor Braga da Cruz, ouvidos os dois abelhudos, arrumou de vez a questão, dizendo-lhes, muito cortesmente, que não podia aceder às propostas deles, uma vez que se comprometera connosco, conscientemente (“Comprometi-me com os rapazes, e em plena consciência o fiz” – foi a expressão do Professor), e que não via (que não havia) motivo algum para voltar com a palavra atrás. “Sou homem de uma só palavra, e como tal, incapaz de dar o dito por não dito”- acentuou.Já agora, resta acrescentar que foi, expressamente, por vontade de Braga da Cruz – desejo manifestado por ele, à data da vergonhosa entrega da Guiné aos facínoras do PAIGC – que nós, acatadoramente, e por inteiro concordantes, tratámos de dar, ao ponto primeiro do nosso programa, uma redacção algo diferente da versão original. Do renovado teor dessa cláusula lhe demos conhecimento, por via telefónica; e foi sobre a sua aprovadora ratificação – cumulada, aliás, com um fervoroso e encarecido e acicatante incitamento a que fizéssemos sair, quanto antes, o nosso manifesto partidário -, que enviámos o mesmo para a tipografia, e o pusemos a imprimir.Depois disto, pergunto eu: é, ou não é, de considerar imperdoável – e por demais condenável – o silêncio de Braga da Cruz (pai) perante a ignóbil carta do filho?!... A mim, quer-me parecer que estamos em presença de uma atitude nada abonatória do amor da Verdade, do espírito de isenção, da verticalidade moral que eu julgava timbre do velho Professor…Revertendo, ainda, à odiosa cartinha do menino Manuel António, é de morrer a rir que, em dado passo da mesma, se mimoseie o M.A.P. com o epíteto de “agrupamento subversivo”. – Vinda de quem vem, a qualificação é de gargalhada… e estridente. E tanto mais estridente, quanto é certo que, de agrupamentos subversivos propriamente ditos, está Portugal a abarrotar, está Portugal cheiinho e atulhado: a começar na pandilha (desgovernativa) e a acabar no Movimento das Cabeças Armadas, passando (está claro) pela Esquerda Socialista, - a ementa da subversão dá para todos os paladares…Já no declínio da carta, os do M.A.P vêem-se ainda apodados como “grupo de aventureiros sem escrúpulos”. Ora, devo dizer ao signatário, para seu governo, que, quanto a isso, de aventureiros sem escrúpulos, os que há estão no Poder: mormente em Lisboa, em Bissau, em Luanda e em Lourenço Marques.E temos conversado.Com base no que aí fica exposto, creio, assim, não poderem subsistir mais suspeitas, quanto aos desígnios prosseguidos por todos aqueles que se encontravam alistados no MOVIMENTO DE ACÇÃO PORTUGUESA. Fazer inflectir o rumo trágico dos acontecimentos desencadeados pelo 25 de Abril, - era isso, o que a gente do M.A.P. se propunha: isso, e não propriamente matar fosse quem fosse. Até por termos plena consciência de que já não havia (nem há) punição suficientemente punitiva para os fautores de tanta traição e cobardia juntas…Hoje em dia, já não é preciso ser lince, para ver o 25 de Abril – a par de um bluff militar muito bem sucedido – foi uma jornada de rematados traidores à Pátria: isso está à vista de todos, ainda mesmo dos mais míopes… A sensação de rua, que me foi dado experimentar e trazer para casa nesse dia, depois de percorridos, um por um, e observados in loco, todos os pontos nevrálgicos que as Forças Armadas (melhor dizendo: que as Forças… “a armar”) iam criando por Lisboa fora, claramente pastoreadas pelo Partido Comunista; essa sensação, mediante a qual intuí logo, que se estava no limiar da derrocada nacional, - nada tinha de enganador. Infelizmente, correspondia em cheio à calamitosa realidade dos factos! Os dias que se seguiram foram, a esse respeito, bem reveladores da pestilenta estrumeira humana e das vagas de esterco moral que, acto contínuo ganharam de assalto a capital, propagando-se, depois, ao continente inteiro, numa assoladora e devastadora enchente de malefícios, que alastrou, enfim, à maré-alta, por todo o espaço português. Desgraçadamente, a minha capacidade de resistência (ou de habituação) ao nojo é por demais limitada, para que possa relatar fielmente o que foram esses dias latrinários… E o caso é que o vazadouro continua: em matéria de entulho social, dir-se-ia que o esgoto da Nação é inesgotável. – Que de lixeiras incubava, em seus esconsos, esse País desventurado que foi meu!...Cá por mim, dou em sustentar que as responsabilidade de primeiro grau, em toda a tragédia sem nome que se abateu sobre a flagelada Terra Portuguesa, há que assacá-las, muito especialmente, a esse general-fracasso que dá pelo nome de António de Spínola. Começa logo, porque o viveiro da traição foi a Guiné. Mais: o detonador da traição foi um livro de Spínola. Mais ainda: a vedeta da traição foi o mesmo Spínola. Foi Spínola – sempre ele – quem, inclusivamente, descerrou fronteiras ao invasor, e abriu, oficialmente, todas as comportas à subversão, ao consentir na legalização da canalha vermelha, a qual saltou de pronto para a garupa do MFA (e, ou redondamente me engano, ou já de lá não desmonta tão cedo…)Na plenitude da sua prosápia e da sua patológica insensatez, esse palhaçote trágico fardado de general desencadeou um processo vertiginoso de aniquilamento nacional (e até mesmo pessoal) que nunca mais foi capaz de controlar e em que não mais teve mão. Canhestro e acéfalo, António de Spínola incorreu e laborou no erro crasso de apelar demagogicamente para a sarjeta nacional, logo desde as primeiras horas, em vez de erguer bem alto a sua de militar em louvor de meia-dúzia de virtudes cardiais. Preferiu lisonjear os mais baixos instintos do Povo Português, e a sarjeta, está bem de ver, desbordou inundadoramente, arrastando-o, também a ele, na voragem, ao cabo de cinco meses de indecente e má-figura à frente dos destinos da Nação.Sem honra nem qualquer ponta de proveito (e antes com as mais irreparáveis consequências para o país), Spínola averbou, assim, mais um fracasso, a juntar ao seu já sortido pecúlio de misérias. (Recorde-se, a propósito, o desastre de Conackry; a culpabilidade, que sem dúvida lhe assiste, na morte do tenente-coronel Pereira da Silva e dos majores Passos Ramos e Magalhães Osório, barbaramente sacrificados, todos três, aos caprichos demagógicos de Spínola; o espectacular insucesso a que ele viu votadas as manobras que intentou levar a cabo, de parceria com o ex-Primeiro-Ministro Palma Carlos; as ultrapassagens constantes que sofreu, aquando do colapso do Primeiro Governo Provisório, e ao longo de toda a crise que precedeu a formação do segundo Gabinete; para já não falar, sequer, da colecção de malogros em série, na condução da chamada política de descolonização(1), ou do grau de pusilanimidade, que ele deixou transparecer, à evidência, quando foi do 28 de Setembro. Etc.,… etc.,… etc.,…)Como se vê, uma folha de serviços que é um sudário!...E o que é mais espantoso é que, mesmo agora, não falta, ainda assim, muito quem sustente que o discurso em que Spínola renunciou oficialmente ao seu (ilegítimo) mandato de Presidente da República, o redime, automaticamente, de tido o que de monstruoso se fez, à sombra da farda profanada, da farda sacrílega, que ele enverga!... Cá por mim, não distingo Spínola dos outros, porque não distingo entre traidores e traidores. E Spínola não é senão o que se chama um acabadíssimo traidor: aceito que se trate de um traidor traído – em Portugal, vai havendo um pouco de tudo, é bom que se note; inclusive, a existência de um bom número de traidores traídos, já a estas horas é fenómeno insofismável que convém assinalar -. Ora, Spínola traiu, primeiramente, tudo e todos; traiu-se, depois, a si mesmo; e, por fim, foi traído: lindamente traído, diga-se de passagem.Pois bem. A meu ver, António de Spínola só poderá considerar-se resgatado de quantas enormidades praticou (ou deixou praticar), a partir do momento em que devolva – em que restitua – Portugal a Portugal, recobrando para o retalhado Corpo da Pátria tôdolos territórios esbulhados, ou em vias de presúria, e reimplantando, na Metrópole, pelo menos a ordem que por lá vigorava, à data em que Sua Excelência fez a sua caricata aparição na cena política portuguesa.Não é resignando, comodamente, a um mandato presidencial a que nunca teve jus; não é arreando com o fardo de uma Nação, cuja consistência histórica – antiga de 8 séculos, bem contados… - ele próprio ajudou a despedaçar, em cerca de 5 meses; não é debitando (demais a mais, tarde e a más horas) desgostosas razões de queixa, quanto aos logros e manobras de envolvimento e de entorpecimento, as mais tortuosas, em que tolamente se deixou cair, fazendo com que a Nação em peso – por um fenómeno, digamos assim, de tracção… - resvalasse, também Ela, pelas ruas da amargura; não é, em suma, com palavras – ainda por cima, tardiamente pronunciadas, digo e repito -, que um chefe político, e muito menos um chefe que se pretende militar, entra na via da remissão, mormente depois de ter dado origem a toda uma catástrofe histórica de extensíssimas dimensões.É com actos de afirmação, e não, nunca, jamais com palavras de renúncia – e de renúncia a um posto político, em que ele, para além de tudo, não era visto nem achado – que um líder que se preze de o ser, que um oficial-general digno desse nome, age (e reage) em situações extremas. De facto, não lembra ao mais pintado, que os militares – como vai sendo comum de se ver em Portugal, nos dias que correm – desatem a exprimir-se, não pelas armas, mas em livros: em livros pré-primários (que outros lhes escrevem, bem entendido…) Ora, a tristíssima verdade é que está sendo apanágio dos militares portugueses – quase todos, de resto, uns fraca-letras – administrar coragem por via oral ou escrita; exporem-se pelas armas, e jogarem a vida numa cartada heróica, isso nunca: de maneira nenhuma! O amorzinho que têm à pele, não conhece limites. - Bravos estilistas! Bravos oradores! Mimosos militares!...Focando, concretamente, o caso singular desse Marchueta(2) fardado que é o general Spínola, ocorre perguntar: - que ponderosas e poderosas razões o terão levado a denunciar, publicamente, só em 30 de Setembro de 1974, toda a sorte de atropelos e de iniquidades, de que deveria ter dado fé, e feito constância, incomparavelmente mais cedo?!Spínola dirige-se à Nação com três meses de atraso, pelo menos. Tivesse ele tido a coragem de trazer ao conhecimento do país real, em devido tempo e a horas certas, esse sem-número de desvios que cedo se principiaram a cometer e a urdir nos bastidores do Poder, mormente quanto aos pontos vitais da política ultramarina, - e já as Províncias Portuguesas da Guiné e de Moçambique não seriam, seguramente, os feudos, que hoje são, de execráveis quadrilhas de bandoleiros!...Assim, toda a intrínseca cobardia de Spínola reside no facto de não ter atalhado, a tempo e horas, à traiçoeira confabulação dos entreguistas.Tivesse ele cortado o mal pela raiz, logo à nascença – isto é, à data em que a Guiné foi unilateralmente posta em hasta pública -; tivesse ele tido a hombridade de prevenir e de precatar a Nação – quando ainda era tempo – dos torpes e torvos desígnios de uns tantos obstinados traidores à Pátria, - e já a Guiné não teria sido teatro de uma independência – ou por outra: de uma dependência – imposta, à má-cara, à viva força, o que se chama a todo o transe, à vontade das populações, as quais só a poder de sangue se deram por vencidas no seu desejo de permanecerem portuguesas: cinco mil e tal guinéus já, a estas horas, pagaram com a vida o seu tributo de inteira fidelidade à bandeira nacional. Violentados nas suas mais íntimas aspirações patrióticas, somente se renderam, depois de mandados desarmar às ordens do spinolista Fabião, que em seguida os deixou, indefesos, à mercê do PAIGC. E a chacina e a sangueira (particularmente, entre os lealíssimos fulas) não se fizeram esperar, perante a passividade, a complacência e a total contemporização, e cumplicidade, do patibular Fabião – “homem de grande sensibilidade poética”, no dizer de Otelo, “o irreversível” – !...E foi assim que a Guiné Portuguesa (que passava por ser, e bem devia ter sido, a grande comenda de honra do general Spínola) se constituiu, daí em diante, na ominiosa vergonha da sua ligeireza de processos, da sua leviandade de escrúpulos, da sua criminosa incúria, da sua teatral responsabilidade!...Em tudo idêntico, reeditou-se em Moçambique o mesmíssimo fenómeno da entrega e do abandono da Província às hordas do terror, sem que o mutismo acobardado do general-fantoche se quebrasse, ainda mesmo quando todas as etnias da população, ombro a ombro com os europeus lá radicados, heroicamente se sublevaram, a 7 de Setembro de 1974, numa avassaladora demonstração de unidade lusíada, a que os vendidos – os vendilhões – de Lisboa (bem secundados, de resto, pelas fardas da traição estacionadas na Província) acabaram por pôr cobro, decretando o mais hediondo dos massacres. O número de vítimas – pertencentes, repito, a todas as raças e a tôdolos credos – foi da ordem dos quatro milhares. E Spínola, impávido e sereno: mudo e quedo qual penedo diante de outro penedo!... E o 25 de Abril, “ainda então a botar figura de revolução pacífica, levada a efeito, e consolidada, sem derramamento de ponta de sangue!...Até que sobrevém o 28 de Setembro. E mais uma vez, como era de prever, António de Spínola deu de si, dando inteiramente de barato com a oportunidade, única e sem-par – a última, por sinal, que teve à mão – de chamar a si poderes que nunca conheceu, não tanto porque não pôde, como porque jamais soube agarrá-los; e era imperioso que ele os tivesse agarrado o que se chama às mãos ambas, o que se chama pelos cabelos, quando foi tempo disso. O mal é que Spínola, só em desespero de causa, só em última instância, só in extremis, deu em apelar para a tal maioria silenciosa, - que ele próprio, de resto, ajudara a silenciar, desde as primeiríssimas horas da revoluçãozeca de Abril, ao dar o seu implícito agrément a toda a enxurrada de aleivosias e abusos, de malfeitorias e prevaricações, que publicamente se expandiram a Portugal inteiro.Um tanto à contre-coeur, e por demais vexada – como é natural, dado que se tratava, para todos os efeitos, de apoiar um traidor, com graves culpas no cartório, quanto à situação que se criara -, a tal maioria dispôs-se, ainda assim e apesar de tudo, a responder à convocatória, a corresponder, em massa, ao repto do general, e a acorrer sobre Lisboa para o aclamar – imagine-se: para aclamar semelhante bonzo! –. (E aqui, vem à colacção acentuar, à laia de mero comentário, que, por estas e por outras, e em face de tanto dislate e de tanto disparate pegado, já então se tornava impossível em Portugal fora de um manicómio!...)Quanto à maioria silenciosa, se silenciosa andava, silenciada ficou: uma vez, António de Spínola deixou que se gorasse um excelentíssimo ensejo de tomar para si alguma força, deitando tudo a perder. Como de costume…- Inditosa pátria que tal filho teve!...Sendo, por natureza, incuravelmente tíbio e desastrado, e como tal, vulnerável a toda a espécie de chantagens mais ou menos ameaçadoras e intimidatórias, - o caricatural general, ainda uma vez, foi presa fácil dos burlões, que em má hora, ele próprio elevou à dignidade de membros de Governo; e bastou que eles lhe acenassem com a eventualidade de se registar uma confrontação, mais ou menos violenta e sangrenta no decurso da manifestação da maioria silenciosa, para que Spínola desatasse a tiritar de coragem, declarando interdita a concentração popular e abdicando, logo após, de todas as suas (mais que ilícitas) prerrogativas de chefe de Estado.Espírito muito mais impressionável, pelos vistos, à ideia de um banhito de sangue na Metrópole Lusitana do que a todas as atrocidades que iam tendo por cenário a Guiné e Moçambique, - António de Spínola lá acabou por soçobrar aos ardis da chantagem, a pretexto de vislumbrar um poucochinho de sangue nas infectas ruas de Lisboa… - Sinceramente, não atino com os reais motivos de semelhante fobia (quanto ao sangue que pudesse vir a verter-se na capital…), já não é de descurar, inclusive, o papel altamente profiláctico que o sangue tem desempenhado na História Política dos Povos. E atrevo-me, assim, a indagar: para que anda Spínola, no fim de contas, a poupar sangue, no que concerne, exclusivamente, à Metrópole, sublinhe-se, - se é certo e sabido que, mais cedo ou mais tarde (e quanto mais tarde, pior será…), tudo há-de acabar, pela certa, numa sangueira inenarrável, - em Lisboa como em Bissau ou como em Luanda, em Lourenço Marques tal como no Porto ou como na Beira?!...Lá que Spínola haja prescindido da magistratura presidencial que ninguém, de direito, lhe outorgara, declinando o mandato respectivo, - ainda vá que não vá, e até foi bonito de se ver. Mas lá que ele, do mesmo passo, tenha renunciado (por omissão voluntária) à sua qualidade de cabo-de-guerra – que tão à viva força estima ser -, escusando-se, desse modo, à grandessíssima maçada de declarar abertas as hostilidades entre as forças vivas da Nação e a anti-Nação; lá que lhe tenha falecido estaleca para se arvorar em líder militar, e assim, concitar a que o seguissem todos aqueles que entrevêem, num golpe de força ou na guerra civil, a única via de salvação nacional ainda em aberto: - lá isso é inadmissível! E bem vistas as coisas, teria sido essa, igualmente, a única atitude susceptível de o resgatar, também a ele, de tanta e tanta vilania! – A verdade, porém – a grande verdade -, é que sua excelência, o general Spínola, não é muito dado a actos de coragem, ou coisa que com isso se assemelhe. Para servir de estrela ao 25 de Abril, esteve ele inteiramente pelos ajustes, e como tal foi sendo usado; mas nunca lhe passou pela cabeça – ainda mesmo depois de ter sido enxotado do “poleiro” – a ideia de pôr em marcha um movimento de sinal contrário, que colocasse as coisas no são, metesse o País nos eixos e proporcionasse uma batida a todos os traidores (Spínola não incluído). Simplesmente, acontece que proezas destas, façanhas assim, não são lá com ele… Para aí é que ele não está positivamente virado!...- E é isto, um general?- Eu chamo a isto, um “cepo”.E, já agora, querem saber quem é que pontificava – designado, para o efeito, pelo próprio general – na Casa Militar da República, enquanto Spínola morou em Belém?...- Pois nada mais nada menos do que um comunista de longa data: o tenente-coronel (ou lá o que é…) Robin de Andrade!A muitos, poderá parecer que é uma deselegância, da minha parte, a forma virulenta, e mesmo desapiedada, como eu traço aqui o perfil de Spínola, - mormente agora que ele caiu em desgraça. Mas não vá sem resposta quem tais coisas pense do meu procedimento: de facto, a ordem de grandeza das responsabilidades, que tocam, bem de perto, ao general, no aluimento de Portugal, afigura-se-me tamanha, - que, afinal de contas, não lhe dou senão o tratamento de choque que me merecem sempre aqueles que eu tenho na conta de altos e refinadíssimos traidores. Sinto-me, de resto, extremamente à vontade para o desencar sem comiseração, mesmo a estas horas; e isto, porque bem cedo lhe adivinhei a traição, e cedo o zurzi, publicamente, em crónica aparecida na revista “Gil Vicente”, oito depois do 25 de Abril…E chega de Spínola!Quanto à pessoa daquele que lhe sucedeu na chefia do Estado (o general Costa Gomes), bastará dizer que, em matéria de traições à Pátria, é bem o que se chama um veterano: tem estado em todas! E quanto mais trai, mais avulta!...Igualmente de vulto, é o caso de Otelo Saraiva de Carvalho: Otelo e maila sua paranóia de terceira; Otelo-o-bronco, Otelo-o-patego, Otelo-o-labroste, Otelo-o-etílico, Otelo-o-lapuz, Otelo-o-piroso-de-meia-tijela, Oteço-o-tal que era agente da SOTERRA e capitão em part-time, mas que é hoje brigadeiro de geração espontânea; Otelo-o-grande-labrego; Otelo-o-fala-barato, que sobre quase tôdolos temas discreteia, sem saber nada de nada, sem saber nada de tudo, alardeando o seu enciclopédico analfabetismo; Otelo-o-dandy-de-Oeiras, o gentleman-da-Reboleira, o-pipi-de-Santo-Amaro, o-super-galã-de-Algés, superstar-da-Outra-Banda…Otelo: um caso clínico!Mas de casos clínicos e de casos de polícia está repleto o actual (des)governo de Lisboa. Analisá-los, um por um, não pagaria a pena. Não paga a pena gastar latim com tão ruins defuntos.Vai alta a hora da plebe: - toca a fartar, vilanagem!...E é tudo, senhores.Ao menos por agora, tenho dito.
Rodrigo Emílio
Notas:
  1. E a propósito de “descolonização”: - para quando a descolonização da Metrópole Lusitana?!...
  2. Tonto inútil” do regime caetanista.

RE

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